Luciano Jardim programa viagens com
prazer. É esse o seu meio natural que conhece perfeitamente,
especialmente o mercado espanhol, para onde, anualmente, leva cada
vez mais madeirenses.
Faleceu a 17 de fevereiro de 2012.
Desde os tempos de escola que sente
necessidade de ser financeiramente autónomo. Poupa ao máximo o
dinheiro que o pai lhe dá e, desde os últimos três anos do liceu,
até ao sétimo (actual 11º ano) trabalha durante as férias de
Verão. Com o despachante de Alfândega José Manuel Sousa. E
organizando bailes na Discoteca Picasso, no hotel Miramar.
É
precisamente neste último ano que desperta a sua vocação para o
mundo das viagens. Colabora com a agência Wagons-lits Cook na viagem
de finalistas às ilhas Canárias.
Terminado o liceu Luciano
Jardim dá primazia à irmã para tirar um curso superior. Sente-se
com mais vocação para ganhar asas mais depressa e reforçar o voo
de autonomia financeira que há algum tempo começou.
3
empregos
Termina o liceu em Julho. Em Agosto
está a trabalhar na Wagons-lits Cook, na Avenida Arriaga, no
Funchal. Faz transferes e assistências aos turistas continentais
que, nesse ano de 1976, surgem em grande número.
A juntar a esta
actividade, trabalha nos bares dos hotéis Bungavília, Estrelícia e
Mimosa.
Em Outubro, começa também a dar aulas na
Tele-escola. Tem três empregos. De manhã, na Wagonlit, à tarde, dá
aulas, e, à noite, serve nos hotéis. Há dias que dorme duas/três
horas. Aguenta este ritmo oito meses. Em três meses paga ao pai os
80 mil escudos que este lhe empresta para comprar o seu primeiro
carro, um Mini.
Deixa o ensino. Passa a tempo inteiro para
agência de viagens. Colabora no departamento de receptivo.
Os
grupos
Entretanto, dá-se o acidente aéreo
onde falece o seu colega Dromond Borges, responsável pelo receptivo
da empresa. Fica com o cargo. Deixa a hotelaria. Trabalha no
“incoming” com os operadores Thomas Cook e Jetours. Cinco meses
depois, um colega seu, Luís Marques, vai fazer o serviço militar.
Passa para o departamento de grupos da agência de viagens. Na
exportação começa a fazer o que mais gosta: criar programas de
viagens. Organiza excursões das várias paróquias. A primeira que
põe de pé e vai é uma peregrinação a Fátima, Andorra e Lourdes.
Não conhece nada do que vende. Antes disso só esteve em Canárias,
Lisboa e Évora, onde foi acompanhar o Marítimo. No entanto, estuda
o percurso com recurso aos guias Michelin.
Até então, os
guias não fazem mais do que as excursões e os check-in dos hotéis.
Luciano Jardim faz mais que isso. Ajuda as pessoas que necessitam até
aos quartos. Leva as malas quando necessitam.
Antes de
partir, porém, o gerente da agência tem de pedir ao seu pai
autorização para que o jovem Luciano possa acompanhar a
peregrinação. Numa altura em que ainda é necessário passaporte
para estes países.
A criatividade
Na primeira viagem é posto à
prova a sua criatividade quando regressa. Ao passar por Saragoça,
depara-se com um piquete de greve a barrar a entrada no hotel Goya.
Admite que a internacionalização da Wagons-lits Cook vai
desbloquear a situação. Mas recebe uma resposta negativa do seu
colega da cidade espanhola. Em Portugal já é tarde. As agências
estão fechadas. O telemóvel ainda não chegou para
facilitar.
Volta ao autocarro onde estão os 55 turistas da
Madeira. Conta duas anedotas e diz que há uma ligeira alteração ao
programa. Vão visitar a catedral de Saragoça, onde está Nossa
Senhora do Pilar, a padroeira de Espanha. Mostra o monumento e
descreve-o. As pessoas estão satisfeitas. Luciano Jardim continua a
pensar para si como vai sair daquela.
Entretanto vão para
as margens do rio Ebro, fala da fábrica de automóveis Ebro. Deixa
as pessoas a passear. Entra numa pastelaria e consegue que façam 110
sandes de queijo e fiambre. Compra sumos. Distribui pelos assentos no
autocarro. E continua a pensar na saída para essa noite antes de
seguir viagem para Madrid, onde deviam pernoitar no dia seguinte.
Decide ligar para a capital. Pergunta para o hotel se também estão
em greve e recebe resposta que não há nada disso. Então questiona
sobre a possibilidade dos clientes dormirem lá já essa noite. Do
outro lado ouve palavras concordantes. Respira de alívio.
Os
clientes começam a chegar ao autocarro. Ficam espantados com a
inesperada refeição. O veículo inicia a marcha. E a sair da
cidade. Mais duas anedotas e umas brincadeiras e começa a explicar o
que se passa. Todos aceitam e dão palmas pela forma como consegue
resolver. E, mais que isso, sem que se tenham dado conta. Chegam ao
hotel, em Madrid, às 23.30 horas. Acaba por oferecer um programa
mais completo na cidade no dia seguinte.
A partir daí
modifica a forma de se fazer viagens na Madeira. Aprende com os
colegas estrangeiros com que se cruza.
No ano seguinte à
primeira experiência a Wagons-lits quase triplica o número de
peregrinações. Inclui uma viagem a Itália.
Ao mesmo
tempo, além da paróquia dos Álamos, começa a ganhar outras da
Madeira e do Porto Santo.
Ritmo de trabalho intenso
O ritmo de trabalho aumenta.
Por
vezes, chega a casa à Madeira no voo das 21 horas. Entrega a mala à
mãe que a põe pronta para o dia seguinte. Entretanto vai para a
agência. Emite os bilhetes de avião e parte no próximo voo das
7.
Outras vezes, e durante anos sai da Madeira em Maio e só
regressa em Outubro.
No meio destas programações, lança
viagens para Canárias. Com brochura a preto e branco impressa na
Tipografia Andrade. Nesse tempo, entre 1976 e 1981, ainda não há a
opção pelo charter. Utiliza as duas ligações directas que a TAP
tem da Madeira com Gran Canaria no Verão.
Além disso, ainda tem
as viagens de longo curso e grupo. Várias vezes acompanha grupos ao
extremo oriente e ao Brasil.
A Barbosa
Em 1981 alguns quadros da
Wagons-lits montam uma nova agência de viagens, a Barbosa. Luciano
Jardim não faz parte do projecto. É um pouco autónomo dentro da
agência.
No entanto, já com o projecto em andamento, o
amigo Luís Marques, fala consigo. Pergunta se quer integrar a
equipa. Pensa na proposta e, em 24 horas responde
afirmativamente.
Em Maio desse ano, na Barbosa, assume o
departamento de programação. É basicamente o mesmo que faz na
anterior agência. Mas em maior dimensão.
Quinze dias depois já
está a viajar com quatro ou cinco grupos. No ano seguinte faz o
maior grupo alguma vez feito na Madeira. Uma viagem de acompanhamento
do Marítimo que joga em Faro. São mais de mil pessoas. Ficam em
Tavira, em Pedras del Rei, onde enfrenta alguns contratempos que
consegue controlar e dar a volta. Em vez de ficar duas noites nessa
unidade, a segunda é passada em Lisboa. Curiosamente, a operação é
feita com o apoio do Club Vip (que, mais tarde, na fusão com o Mapa
Mundo, culmina no actual Mundovip).
Acompanha grupos durante três
anos, mas, depois, deixa essa tarefa para outros. As necessidades da
empresa precisam cada vez mais de si por cá. Além do que já tem,
fica com a incumbência das viagens dos clubes da região. Contudo,
quando fica com as viagens organizadas do Círculo de Leitores, a
partir do continente, tem de acompanhar os grupos. Chega a estar um
mês inteiro em Marraqueche, Marrocos, com 1.000 pessoas, 250 em cada
semana. Depois, com a mesma empresa, fica um mês em Paris. E assim
por diante durante cinco anos, com escalas, por exemplo, em Londres e
no Brasil.
Os charter com a Air Sul
Surgem novas companhias em Portugal
como a Air Sul. Com ela faz a primeira grande operação charter, que
permite baixar radicalmente os preços das viagens. Trabalha com a
companhia dos aviões brancos dois anos. Até que esta fecha a
porta.
Ocupa o seu lugar a Air Atlantis. Faz dois voos com
esta companhia da TAP, e com a Portugália. Algum tempo depois, a Air
Atlantis borrega e deixa de voar. Passa a trabalhar com a Air
Columbus. As vendas sobem vertiginosamente. A Barbosa esgota a
capacidade da transportadora azul e amarela. Além de Canárias,
consegue fazer charter para Lisboa a 10 mil escudos.
O tal dos
Charter
Com este feito, chega a merecer um
comentário de Maria José Ritta, esposa do ex-Presidente da
República Jorge Sampaio, então na TAP, quando a Barbosa vai receber
o prémio de nº1 das vendas da TAP
O delegado de então da
companhia na Madeira, José Morais, quando Luciano Jardim vai receber
o prémio com os colegas, diz à directora da empresa que é ele o
tal dos charter. Do outro lado ouve que se ele é o número da TAP,
pode continuar sempre com as outras desde que não baixe as vendas da
companhia de bandeira nacional.
Em 1996 sente que o projecto
Barbosa tinha tido o seu tempo. Entre os muitos projectos que tem
entre mãos, há o do Círculo de Leitores, que teria como destino em
2007 Cuba. Fala abertamente e passa este pacote para outros.
Por
estas alturas, alguns colegas, entre os quais Luís Marques, deixam a
Barbosa para abraçar um novo projecto. Na Bravatur. Luciano Jardim
não vai. Mantém-se. Faz uma retrospectiva e vê o que foi feito com
aquela empresa e olha com paixão pelos clientes que trabalham
consigo. Além disso, tem grande admiração pela equipa e quer
mostrar a si próprio de que forma, sozinho a coordenar, é capaz de
conseguir. E consegue, no final de 2006 bate os recordes dos
recordes.
Vence o desafio. Entende que é hora de partir
para outra.
Saída para a Portimar Madeira
É convidado para liderar o
projecto Madvia. Não o cativa suficientemente. Quer continuar nas
agências de viagens. Vai para director comercial da Portimar
Madeira. Leva consigo algumas pessoas da Barbosa e fica igualmente
com a programação.
Consegue colocar a agência em número um.
Abre novos balcões, como o do aeroporto e o da Avenida Arriaga, que
desenha o layout.
Ao fim de dois anos e meio na empresa entende
que tem a missão cumprida por ali.
Novamente, surge o convite do
amigo Marques. Depois de o querer levar para a Bravatur e para a
Madvia. Diz que, agora, tem de aceitar. Estuda e decide tomar as
rédeas do operador madeirense.
Levanta o operador e, como é
seu timbre, trá-lo para a liderança das vendas de pacotes de férias
às agências de viagens.
O projecto Mundovip
Em 2002, está na BTL, em Lisboa. É
sondado sobre a sua predisposição para aceitar um projecto de um
operador nacional que pensa investir na Madeira. Diz, de pronto, que
sim. Entende que lhe perspectiva novos horizontes.
Aí por
Fevereiro, recebe a luz verde que o projecto vai avançar. Ainda faz
a operação de Páscoa. Em Junho está de malas e bagagem no Club
Vip Madeira. Um operador de viagens que mais tarde, com a fusão como
Mapa Mundo, dá lugar ao Mundovip Madeira do grupo ES Viagens e de
algumas das principais agências de viagens da região.
Hoje
é director geral do operador e líder incontestado na programação
de férias para as ilhas Canárias e com vasta programação para
outros destinos mundiais, a partir de Lisboa e Porto, fruto da tal
janela que vislumbra quando lhe endereçam o convite na capital. São
pacotes onde consegue que o madeirense que opte por sair de uma
cidade continental pague o mesmo que o cliente que resida naquele
território, fruto da política Lisboa - Funchal, onde o operador
assume o custo da viagem desde a Madeira e o regresso à ilha.
Ao
longo de todos estes anos não esconde a felicidade de trabalhar com
grandes equipas. Com pessoas que diz serem maravilhosas. Não esconde
igualmente quem primeiro lhe deu a mão, o padre Sanches, da paróquia
dos Álamos, e o seu amigo Luís Marques.
Releva a questão
cultural das viagens que contribuem para a evolução dos
madeirenses. Inclusivamente reconhece que aprende sempre que
viaja.
Outro factor que releva destes anos é o apoio da família,
onde evidencia o da mulher.
Luciano Jardim faleceu a 17 de fevereiro de 2012.
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