Miguel de Sousa


A política, a ECM e o golfe

Quis ser engenheiro naval. Cursa Finanças e acaba por entrar na engenharia da política. Chega a ser vice-presidente do Governo. Hoje é vice-presidente da Assembleia Regional e é administrador da Empresa de Cervejas da Madeira. Dirige o golfe, mas já abriu a porta para sair.

Miguel de Sousa faz a escola primária no Externato Nun’Álvares (mais conhecido por Caroço), no Funchal.
Muda para o liceu, actual Escola Secundária Jaime Moniz. Ali fica até ao sétimo ano (actual 11.º ano).
Antes de concluir o secundário tenta dar os primeiros passos para concretizar o sonho de ser engenheiro naval. A melhor forma de o conseguir é estudar em Inglaterra. E assim faz.
De malas aviadas parte para o reino de Sua Majestade. Em 1970. Ainda está no sexto ano (actual 10.º).
Contudo, o desejo acaba por se gorar. A questão do serviço militar passa a surgir no horizonte e a perspectiva é ter de ficar muito tempo fora do país. Longe de casa.  Nessa altura, para um jovem, é difícil encarar essa perspectiva. Por isso, decide voltar.
Em vez de ser o engenheiro naval que quis ser, acaba por se licenciar em Portugal na área das Finanças, que hoje abrange mais a área da gestão.
Para trás fica a ligação mais próxima aos barcos que cresce a apreciar e a querer desvendar os seus segredos. A família sempre teve barcos e está ligada aos transportes marítimos.
Ainda hoje nutre uma paixão especial por barcos. Gosta imenso de viajar e tem uma curiosidade particular em saber como funcionam as construções do homem que navegam sobre o mar.
Diz mesmo que alimenta o sonho de ter tempo para dar uma volta ao Mundo num barco à vela. Não obstante, admite que seja um sonho que poderá ser concretizado apenas numa reencarnação. Isto porque, para já, não vê forma de o conseguir concretizar.
Miguel de Sousa diz que começa muito cedo a fazer coisas difíceis.
Desde muito novo que lhe dão grandes responsabilidades.
Primeiro em casa com os pais sempre a confiarem o suficiente para nunca perguntarem se tem boas notas ou exames para se preparar. Tem uma postura responsável. É o primeiro a dizer aos pais, quando, eventualmente, alguma coisa corre menos bem.
No fundo é o que acontece com um tropeção que dá no quinto ano, que tem de repetir.

A “recruta”

A responsabilidade continua quando estuda na faculdade, em Lisboa. Considera que a “recruta” de viver fora de casa, e longe, é um dos pilares fundamentais na formação de um jovem. Na altura, nem telefone tem na casa onde vive.
A mais de 800 quilómetros de casa, tem de contar consigo próprio e com o apoio dos amigos que lá estão.
O período que passa na capital, diz ter sido mais fácil e cómodo que o das gerações mais velhas, mas, com certeza, mais difícil em relação às maiores facilidades que encontram as actuais. A distância é a mesma, mas o conceito de proximidade de casa é completamente diferente.
Quanto ao curso, ainda está na universidade quando se dá o 25 de Abril de 1974.
Acaba de se formar em Finanças, em 1976. Por isso, conhece dois anos de PREC dentro da universidade: o Instituto Superior de Economia da Universidade Técnica de Lisboa.
Na altura, é líder da associação académica o actual secretário-geral do Partido Socialista, Ferro Rodrigues.
Vive as convulsões e peripécias, principalmente tendo em linha de conta que o seu estabelecimento de ensino fica ao lado de São Bento, onde as manifestações são quase diárias. Além disso, a cantina do instituto serve de apoio logístico aos manifestantes.
Recorda igualmente os tempos anteriores à “revolução dos cravos” que condicionam cada vez quem se desloca a Lisboa.

A PIDE

Sempre que voa para a capital é chamado pelos altifalantes o passageiro Miguel de Sousa para se apresentar na TAP. Dali dizem logo que tem de ir à polícia, a PIDE. Isto acontece cerca de cinco minutos depois de fazer o “check-in”.
De cada vez que vai com os homens da “secreta” do antigo regime tem de dizer se é estudante, o que vai fazer a Lisboa... e por aí adiante.
É por esta razão que, quando são abertos à consulta pública os ficheiros da PIDE, Miguel de Sousa tem o cuidado de lá ir para saber se tem ficha, como tantas outras pessoas perseguidas pelo antigo regime. Sempre quis saber por que é incomodado durante os tempos do fascismo. Mas nem sinal de registo. Se houve, pode ter desaparecido.
Perseguições à parte, os últimos dois anos na universidade são vividos então no meio de convulsões. A aversão aos anos do PREC é tanta que deve ter sido o único a formar-se em Julho. No dia em que termina o curso, faz a barba e vem para a Madeira. Durante muito tempo não volta a Lisboa.
E, sem se dar conta, da engenharia naval dos sonhos da juventude, entra na engenharia da política que o acompanha até hoje.
Não esconde que os tempos difíceis do conturbado período político que conhece após 1974 acabam por ser importantes para adequar a sua postura política ao longo dos anos.

Sr. professor

Quando chega à Madeira, a primeira profissão que exerce é a de professor. Na Escola Gonçalves Zarco (antigo Batalhão), no Funchal. Curiosamente, depois de ter notas menos boas em Ciências Naturais, durante o seu tempo de estudante, quando começa a leccionar recebe um horário para ministrar... isso mesmo: Ciências Naturais. Reconhece que é errado e que hoje já não acontece.
É professor por pouco tempo. Acaba por entrar na política. Por acaso.

O convite

Um determinado dia está no Golden Gate. Numa das mesas está Alberto João Jardim. Junto com ele encontra-se Crisóstomo Aguiar. É este último que se levanta e vem até Miguel de Sousa. Pergunta se quer ser director regional de Transportes. Fica surpreendido.
Tem 24 anos e leva algum tempo a responder. Aceita.
Diz que entra na política no dia em que Alberto João Jardim passa a ser presidente do Governo Regional.
É nomeado director regional dos Transportes a 5 de Setembro de 1979. Um cargo que exerce até 1980. Torna-se, assim, no mais jovem governante de sempre no Governo Regional da Madeira.
Deste modo, a responsabilidade que sempre o acompanha desde muito cedo passa a ter de continuar a ser a sua sombra no governo.
Hoje, olhando para trás, diz que, além do engenho e arte, tem a convicção de que teve sorte.

Greve no mar...

Fica com uma área difícil. Os transportes são uma condicionante do desenvolvimento que, na altura, ainda se coloca com maior relevo.
Recorda, por exemplo, a greve da marinha mercante. Durante três meses, no Verão de 1978, a greve retira os barcos que transportam a banana. O transporte deste fruto tropical assume particular importância naquela época do ano. Isto para além das importações normais dos portos de Lisboa e de Leixões, para reabastecer o mercado.
Consegue resolver o problema. Pela primeira vez, reparam no jovem governante que está à frente dos transportes no Governo Regional.

... e no ar

E, para não baixar os índices de adrenalina, no ano seguinte, há uma greve longa de um mês e meio sem aviões da TAP. Os pilotos estão na origem da paragem.
O ministro dos Transportes de então prepara-o para um longo período de dificuldades.
Sem perder tempo, trata de começar com o fretamento de aviões. Na prática, quase montam uma nova empresa que funcione para satisfazer o mercado.
Socorrem-se de aviões militares, onde cada passageiro tem de fazer uma declaração de que aceita viajar sem seguro, e ainda de aparelhos de outras companhias aéreas, com os pilotos a sofrerem uma pressão muito grande dos grevistas.
Em 1980, sucede-se uma situação semelhante. Nesse ano passa a ser secretário regional do Comércio e Transportes. Um cargo que exerce de 5 de Novembro de 1980 a 11 de Novembro de 1984.
O governo em Lisboa já é outro.
Para abreviar a solução do problema da greve, o próprio Presidente da República tem de intervir.
Mas, se é verdade que todos os contratempos provocam dores de cabeça a Miguel de Sousa, não é menos verdade que a solução de todos eles projecta o jovem governante para uma carreira que ainda hoje tem presente com gratas recordações.

Jovem entre grandes

Lembra que, com 27 anos, tem de enfrentar ministros bem mais velhos. E, por vezes, primeiros-ministros. Não é tarefa fácil. Exige cabeça fria e preparação.
De entre os ministros com quem trabalha, recorda o Eng. Viana Baptista. É uma das pessoas que mais o marca, como ministro dos Transportes do tempo de Sá Carneiro.
Recorda que é com ele, ainda presidente da ANA, que começa a regionalização dos aeroportos da Madeira, com o intuito de serem as autoridades insulares a terem o poder de decisão em relação à ampliação da pista. No fundo é o “dossier” mais difícil e longo que tem, com ampliações e necessidade de obtenção de apoios da União Europeia para conseguir concretizar a ampliação final.
Outro momento marca Miguel se Sousa: quando é chamado a coordenar a integração da Madeira na então Comunidade Económica Europeia. É uma tarefa aliciante que diz exigir o máximo das suas capacidades para que o desafio seja bem sucedido.
Considera que hoje a Madeira é não só bem vista em Bruxelas, como nas demais instituições europeias. A 12 de Novembro de 1984 é nomeado secretário regional do Plano. Fica com a difícil pasta até 8 de Novembro de 1988.
Diz que, nesse tempo, não há dinheiro para nada. Reconhece que hoje também não há folga de verbas, mas, na altura em que tem a pasta das Finanças, precisa de muita imaginação para suprir as dificuldades financeiras.
O Governo toma a opção do endividamento, que considera ter sido a decisão acertada no momento em foi encetada.
Se nessa altura «não tivéssemos arriscado, sempre escudados pela capacidade negocial e perseverança que o dr. Alberto João Jardim sempre teve», entende que hoje muito mal estaríamos.
Não obstante, houve momentos difíceis.
Lembra o governo do Bloco Central, liderado por Mário Soares, com o ministro das Finanças Ernâni Lopes.
Diz que são momentos em que «quase nos asfixiaram». Recorda que nunca deixaram transparecer alguns momentos de angústia que viveram nesse período por entenderem ser necessário dar confiança para que a Madeira continue com os índices de desenvolvimento desejável. Um ritmo que, na altura, «já era admirado, não só no país mas desde logo quando entrámos na Comunidade Económica Europeia. Julgo ter recebido unanimidade na convicção de que iríamos sempre ser capazes de desenvolver e concretizar os projectos que apresentávamos».
Sublinha que a Madeira não apresenta projectos que sabe não conseguir executar. Não obstante, tem a convicção de que «fizemos mais do que inicialmente apresentávamos».
Não quer deixar de recordar o governo de Cavaco Silva, durante o qual, com o ministro Miguel Cadilhe, é feito o primeiro Programa de Reequilíbrio Financeiro da Madeira. Num ano, vai 47 vezes ao Ministério das Finanças.
O Governo Regional consegue o primeiro acerto nas relações financeiras entre o Estado e a Região Autónoma da Madeira. Um processo que, curiosamente, é acompanhado pelo actual ministro das Economia, Carlos Tavares, então assessor de Miguel Cadilhe.
Não obstante todo este percurso desgastante, com deslocações constantes a Lisboa e Bruxelas, Miguel de Sousa acentua que o assunto mais difícil de resolver acaba por ser entre portas: os transportes públicos no Funchal. Passar de sete companhias para a Transfunchal e, depois, para a Horários do Funchal.
Diz que chega a haver a ameaça dos empresários de que todos os autocarros iriam ser vendidos para Luanda, em Angola, deixando o projecto da Horários do Funchal sem qualquer meio de transporte.
Para que tal não acontecesse, Miguel de Sousa pôs-se em campo. Consegue que o projecto vingue e que as ameaças não passem disso mesmo.
Apesar dos méritos que lhe são reconhecidos, Miguel de Sousa não quer deixar de sublinhar que o sucesso na vida tem a ver com as equipas que consegue formar e que sabe liderar. «Sozinhos não somos capazes de fazer nada de jeito. Mas, quando temos boas equipas, reunimos todas as condições para brilhar».

Tudo é feito com paixão de quem gosta da terra


Miguel de Sousa é nomeado vice-presidente do Governo Regional em 9 de Novembro de 1988. Um cargo que exerce até 9 de Novembro de 1992.

Depois de deixar o governo, é eleito vice-presidente do Parlamento madeirense em Novembro de 1992.
Durante todo este tempo, trabalha de manhã à noite. Isto para além das obrigações sociais/políticas que ocupam algumas noites e mesmo fins-de-semana.
Hoje diz que nada é de mais. «Tudo é feito com paixão de quem gosta da sua terra».
Em 1992 é eleito deputado à Assembleia da República. Não chega a desempenhar o papel de deputado em São Bento.
É igualmente eleito deputado à Assembleia Legislativa Regional da Madeira pelo Partido Social Democrata em 1984, 1988, 1992 e 1996.

Administrador na ECM

Em 1993 é indicado pelo governo para ser administrador da Empresa de Cervejas da Madeira, em representação da quota da Região Autónoma. Hoje, a quota está no sector privado, no Grupo Pestana.
Miguel de Sousa mantém-se como administrador, com um papel bastante activo, que o leva a viajar aos Açores, onde o grupo tem uma empresa e uma fábrica, e a Cabo Verde, onde tem igualmente uma empresa e uma fábrica.
Na prática, está a exercer um cargo de acordo com a sua formação, apesar de ter sido sempre governante na área da economia. O que lhe dá uma perspectiva global do país e da região, além do conhecimento da forma como se encontram as empresas da Madeira e a maneira como se preparam para os desafios da integração europeia e da globalização.
A actividade privada é uma etapa de vida que sempre quis experimentar.
Em matéria de diferenças entre os dois sectores, começa por dizer que quem nunca trabalhou no governo ou na função pública tem um olhar crítico à eficácia da actividade profissional no sector público. «Mas não me parece tão distante do sector privado. Em alguns aspectos, na Madeira, a função pública tem trabalho realizado, com pessoas competentes».

O golfe

Em Fevereiro de 1995 é eleito presidente da direcção do Clube de Golf do Santo da Serra.
Gosta muito de viajar. Em férias e em trabalho. Acentua que, neste último caso, sair da terra «faz-nos sentir que não estamos no centro do mundo e que podemos ir buscar soluções que depois adaptamos à nossa maneira».
No capítulo das viagens, tem uma predilecção especial pelas ilhas. Mas há uma por que tem um gosto especial: o Porto Santo, onde passa férias consecutivamente desde criança.

Projecção da Madeira

Miguel de Sousa é ainda gerente da Corama, embora não tenha actividade prática. É uma herança familiar.
Hoje desenvolve a actividade política e a actividade empresarial, o que obsta a que consiga ter mais tempo para o golfe, como deseja.
E por falar em golfe, considera ter sido feito um trabalho interessante no Campo de Golfe do Santo da Serra. Modéstia à parte, considera que fez «um milagre no golfe». Com a ajuda de todos. Trouxe para a ilha o “Open” da Madeira, uma iniciativa que tem feito passar pela ilha campeões do Mundo e outros que para lá caminham. Com esta realidade, acaba por promover com intensidade a modalidade e, de uma forma geral, o destino Madeira.
Hoje, o golfe é a nona modalidade desportiva federada mais praticada na Madeira. O Clube de Golfe do Santo da Serra é o sexto maior clube da Região e o sexto maior do país.
Miguel de Sousa deixa dentro de pouco tempo a presidência do clube de golfe. Entende que a política e a vida empresarial exigem muito do seu tempo.
E como não gosta fazer figura de corpo presente, prefere deixar a direcção nas mãos de quem tem mais tempo.
Referência ainda para o facto de ser o primeiro presidente da Comissão Política Regional da JSD - Madeira. Até aos 30 anos.
Ao longo da sua carreira participa nas estruturas do partido a nível regional e nacional.

Amigo do 1.º ministro

Neste momento dá-se a particularidade de ser amigo do primeiro-ministro, Durão Barroso, e do presidente do PS.
Recorda que Durão Barroso começa com muito poucos. Continua com muito poucos, até que muitos o elegem. Hoje não tem dúvidas quando diz que temos um excelente primeiro-ministro.
Em jovem, Miguel de Sousa entra em ralis. Como co-piloto de Janica Clemente, é campeão da Volta à Madeira em 1975.
Hoje, como “hobby”, a seguir ao golfe, gosta de jogar bilhar.

“Devorador” de jornais

Chega a ser vice-presidente e presidente adjunto da direcção do Clube Desportivo Nacional. Presentemente não faz parte da direcção do clube.
No domínio das leituras lê 10 jornais por dia. Fora os semanários. Lê o que pode no próprio dia. O que não tem tempo guarda em recortes para domingo à tarde e à noite, e passa igualmente a ver televisão.
Lê jornais generalistas nacionais e o reputado ABC de Espanha, para saber o ritmo dos nossos vizinhos. Quando está no governo, lê todos os dias os jornais de Canárias e dos Açores. Ainda hoje lê o Açoriano Oriental. É uma leitura que faz em suporte de papel.
Para livros sobra pouco tempo. Acaba de ler “O português que nos pariu”, de uma escritora brasileira.

Paixão pela escrita

Outra paixão é escrever. Escreve sobre actualidade. E ainda para tomar nota de coisas que se vão passando na sua vida que leva com pontualidade. Faz questão de ser sempre pontual. E admira quem o faz também.
No domínio da actualização, Miguel de Sousa participa frequentemente em seminários e congressos e procura sempre estar a par do que se passa no Mundo.
Quanto às novas tecnologias, nomeadamente a Internet e o correio electrónico, não está muito para aí virado. Mas admite que um dia venha a dedicar mais atenção. 

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