Amélia Pinto

A ousadia de empreender

Amélia Pinto. Nasce na Calheta. No Arco da Calheta, mais propriamente. É criada com umas tias, cujo quintal é contíguo ao dos pais, onde vivem outros irmãos.
Está longe da cidade.
Estuda até a quarta classe. Mais tarde completa o quinto ano (actual nono ano de escolaridade).

por: Paulo Camacho


Cresce com a amizade da família Figueira, da igreja anglicana. Júlio Figueira é lá bispo e empresário dos bordados.
Desde muito cedo, começa acompanhar e conhecer este negócio em todas as suas vertentes: desde a produção até à comercialização. Vem pela primeira vez ao Funchal com sete anos, de barco. Desde então e, apesar da sua juventude, Júlio Figueira passa a confiar-lhe o dinheiro para pagamento às bordadeiras e às tias agentes. O seu sonho é ser costureira, pois o corte e a costura, fascinam-na.
O ambiente familiar é rígido, menos liberal que o dos seus irmãos.
Estes contactos levam Júlio Figueira a sugerir a sua mudança para o Funchal. Amélia Pinto adora vir à cidade, onde aprende muito numa sociedade cosmopolita.

O primeiro emprego

Uns tios que vivem no Funchal podem ser a ponte para poder ficar. Mas os pais não querem que estude.
A liberdade chega aos 19 anos. Quando casa. Altura em que também começa a trabalhar e a estudar à noite para completar o quinto ano. No fundo, tem o grande desejo de aprender cada vez mais.
Há muito que ajuda na colocação das linhas coloridas dos desenhos. Daí que, quando casa, Amélia Pinto recebe logo o convite da casa de bordados da família Figueira. É a “A. Figueira”. Posteriormente “Figueira & Phelps”.
Contudo, o primeiro marido não gosta muito que a mulher trabalhe. Mas como conhece bem a família Figueira concorda que o faça.
Percorre todas as etapas dentro da empresa que hoje já não existe. Fica, no início, na Rua da Carreira. Mais tarde muda para a Rua das Pretas.


África do Sul

A dado momento, deixa a Madeira com o marido e a filha para procurarem um novo rumo na vida. Vão para a África do Sul. Depara-se com contratempos. Por isso, regressa algum tempo depois à Madeira, juntamente com a filha.
Volta a trabalhar na “Figueira & Phelps”, que deixa as portas abertas para uma colaboradora muito estimada.
Na altura, o filho de Júlio Figueira, Aurélio Figueira, que toma conta do negócio, pretende melhorar os ganhos com as exportações para a Venezuela, onde há uma loja da empresa. Uma outra fica na Inglaterra. Isto para além de vendas para outros países.

Aprender na Inglaterra

O empresário decide comprar máquinas em Inglaterra para acelerar o processo produtivo e rentabilizar mais o negócio. Como precisa de alguém para se especializar, convida Amélia Pinto para aprender tecnologia industrial em terras de Sua Majestade. Aceita e aprende muito no curso.
A fábrica é montada na Choupana. Amélia Pinto ensina as colaboradoras a integrarem-se no inovador processo fabril.
Surgem alguns contratempos com as inovações implementadas, que apresenta um produto melhor e mais barato, fruto da visão de longo prazo de Aurélio Figueira.
Amélia Pinto tem um dia muito preenchido. A função  de surpervisora de produção, além da componente técnica, tinha, também, uma forte componente humana, por ser importante motivar e compreender as pessoas com quem trabalhava.
A dada altura, surge algum descontentamento com a compensação que recebe numa empresa onde trabalha de manhã à noite; entende que não está a ser convenientemente remunerada para o seu esforço, num trabalho muito duro e complexo.

O anúncio

Surge o convite para mudar de ares para a empresa “Farra” por intermédio de Brandão Luís. A empresa, concorrente da “Figueira & Phelps”, precisava de uma encarregada. Amélia Pinto diz que, a sair, só com um ordenado muito bom. Mas, mesmo assim, não está interessada. E não vai.
Chega a contar ao patrão da proposta, que parece não acreditar muito. A esposa também não valoriza o trabalho de Amélia Pinto, o que a entristece.
Um dia, vê um anúncio num jornal local de um americano que vem montar uma pequena fábrica, e que, por isso, precisa de uma boa técnica profissional.
Responde ao anúncio e é aceite na empresa de tapeçarias, cuja arte também já conhece da anterior empresa. É técnica de produção.
Vai ganhar três vezes mais.
Algum tempo mais tarde, a empresa derrapa e Amélia Pinto tem de procurar uma solução para a sua vida, que partilha unicamente com a filha. Há muito que se separara do anterior marido.

Empresária

Começa a sentir que é tempo de seguir o seu próprio caminho.
O principal obstáculo constituiu o impedimento do acesso ao crédito por ser mulher. Consegue ultrapassá-lo através de amigos.
No meio de algum impasse, volta a ter um convite para regressar à empresa “Figueira & Phelps”.
Fala um dia com o Dr. Jaime da “Botica Inglesa” e acaba por alugar um armazém antigo na Rua das Pretas, em frente à empresa onde trabalhara e, assim, surge a loja “Passarela” em 1973. Contudo, a custo consegue estabelecer-se.
No primeiro ano, faz experiências: comercializa roupas para criança, senhora e homem. Um ano depois escolhe unicamente as de senhora, que são aquelas que mais vendem.
A dada altura precisa de crédito para reforçar o negócio. Novamente encontra obstáculos no banco por ser mulher. O mesmo fiador que consegue para abrir a loja, volta a ajudar.
Amélia Pinto, que já conhece outras sociedades mais evoluídas, decide comprar roupa fora. Quer introduzir novidades.
Com os anos, a loja consegue fidelizar a clientela. Clientela que a empresária faz questão de considerar sempre uma amiga.

O “Balão Vermelho”

Com a “Passarela” em ritmo de cruzeiro, surge a possibilidade de comprar uma loja na Rua dos Ferreiros. Considera que é muito. O mesmo já não pensa quando tem oportunidade de comprar o emblemático “Balão Vermelho”, situado na Rua do Aljube, junto à Sé, cuja compra se concretiza em 1980.
A sua nova loja direcciona-se mais para o cliente jovem. A outra loja continua para senhora.
Em 1983 abre, juntamente com uma amiga, com quem já desenvolve negócios de roupa para o “Balão Vermelho”, a boutique “Grand Passage”, na Avenida de Roma, em Lisboa.
Nesse ano faz a liquidação total dos produtos existentes da loja, que os complementa com outros idos das lojas do Funchal.
No ano seguinte abre com novas colecções.
Entretanto, tem uma contrariedade com a sócia e tem de assumir 100% da sociedade. A solução é a hipoteca da casa.
Ganha alento e faz uma passagem de modelos monumental na Avenida  de Roma com 24 manequins e, com a locução de Maria Leonor, que merece os maiores elogios da crítica com realce para a empresária e jornalista, Vera Lagoa do “Diabo”.
Quinze anos depois, por alturas do falecimento do marido, que constituiu um grande apoio aos seus negócios, vende a loja.
Antes do “Balão Vermelho” ainda compra uma outra loja na Rua do Surdo para suporte de uma outra que compra na Rua das Pretas. “Magazine” inicialmente, e, depois, “Rodier”, uma marca franchisada. Actualmente tem seis colaboradoras, mas chegou a empregar 24 pessoas em todas as suas lojas.
Em matéria de hobbys, o que mais gosta é de cozinhar. Também gosta muito de ler para se manter actualizada a nível da gestão e da moda.
Alimenta ainda o desejo de tirar um curso de pintura para poder tirar partido do que tanto gosta: as cores.

2003-12-19

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